
COMPASSO
Espírito Santo em Paisagens
Diário de Viagem.
Era um pouco mais de 7 horas quando saímos de nossa escola, o SJB, em direção a Anchieta. Havia uma conversação desesperadora no ônibus: alunos, professores e todo tipo de idéias e razões misturadas dentro do veículo. Tínhamos como percepção comum a paisagem que voava pela janela.
Seguimos em ritmo razoável pela BR 101. O clima era de ansiedade, queríamos aproveitar tudo e por volta das 9 horas daquela manhã diferente chegamos em Anchieta, uma cidade costeira e um ponto turístico e histórico importante do estado. O dia estava ensolarado e para não atrasar o cronograma começamos a subir a ladeira que ia em direção à Igreja Matriz Nossa Senhora de Assunção. Havia uma grande praça com um busto do Padre Anchieta, que é uma peça fundamental na história do município. A praça era cercada por grandes Palmeiras imperiais que chamavam a atenção por sua imponência.
Fomos convidados para entrar na igreja e nos sentar. A igreja tem um aspecto bem rústico e meio monótono, o piso de madeira rugia a cada passo. O guia nos levou para conhecer o santuário e aquela visita realmente nos remontava à época. Visitamos uma câmara com paredes de pedras da época de sua construção. Nesta mesma câmara, escavações mostravam túmulos que nos fez ter dimensão de um passado histórico. Em seguida, fomos guiados a um cela que foi o quarto do Padre Anchieta. Lá havia também algumas relíquias e uma imagem de Jesus.
Depois disso fomos em direção ao poço Coimbra. O sol já se manifestava castigador e só nos esquentou ainda mais diante da frustração com o poço, pois o imaginávamos de outra forma. Deparamo-nos com uma bica d’água que não se parecia nem de longe com o poço que criamos em nossas imaginações.
Voltamos então ao ponto onde deixamos o ônibus e conhecemos um museu não tão grandioso, mas peculiar. Num auditório, o senhor nos contou um pouco sobre a história do museu e em seguidas fomos ver as diversas peças do passado, entre livros, pinturas, cadernos de uma antiga escola só de moças.
Já passava do meio dia, e como saco vazio não para em pé, fomos almoçar em um restaurante típico da região, com uma bela comida caseira. Após o almoço, ficamos admirando a praia que se estendia por toda a costa, o mar era convidativo, mas como caminhávamos sob normas, ficamos somente a admirar.
E entramos no ônibus mais uma vez, agora em direção a Guarapari. No caminho paramos na praia de Mãe-Ba, onde tivemos uma grande surpresa além da beleza do lugar, uma mulher nua, que se alongava na praia como se tudo não fosse nada, como se toda aquela gente que passava por ali, fossem meros coadjuvantes de sua atuação, ela estava chapada, na certa, chapada de visão, visão alheia, própria, unificada, visão de mundo, acho que era mais uma daquelas pessoas esquecidas que perambula pelo mundo, “como se o mundo fosse seu quintal, como uma mendiga sem o poder do capital”. Após o choque, fomos conhecer de perto as falésias sobre as quais nosso professor de Geografia explanou com brilho nos olhos. Claro que ficamos mais encantados com a liberdade e quantidade de água, de vento e de areia que nos encheria de lembranças marinhas.
E a viagem continuou para o nosso próximo e último destino. Fomos para o parque Paulo Cesar Vinha, que como nosso instrutor iria dizer mais tarde, possui esse nome em homenagem a um biólogo que foi assassinado em 1993, devido a sua luta contra a exploração ilegal de areia naquela região. O ônibus continuava com uma conversação desesperadora apesar de mais calma, já era quase 14 horas. A paisagem passava como quadros em movimento pela janela, e o valor daquela experiência ia aumentando a cada quadro. Então, enfim chegamos, e avistei logo de cara a placa do parque, com uma imensa libélula como símbolo. Eu desci do ônibus e parei na porta, esperei todos saírem, e fui por ultimo...
Bom, a primeira impressão do parque foi razoavelmente sem surpresas.
Alguns tomavam água, iam ao banheiro, outros estavam admirando filhotinhos de gambá, e já dava para ver a trilha da Clusia, que é uma arvore típica da restinga, com folhas bem grossas e duras.
Após algumas recomendações, seguimos como formigas pela trilha, mas não carregávamos folhas ou grãos nas costas, carregávamos uma grande emoção e um sentimento de liberdade, que era muito leve por sinal. Saímos da mata mais fechada, e entramos em uma espécie de casebre onde pudemos ver o mapa de toda trilha. A ansiedade aumentava a cada passo na trilha, a cada conversa. Aprendemos mais sobre a restinga e sobre a lagoa de ‘’Coca-Cola’’, que tem as águas avermelhadas devido à grande quantidade de matéria orgânica presente na água.
Chegarmos à praia foi uma satisfação. O mar estava agitado e ventava muito, por isso prosseguimos em uma trilha paralela ao mar, até chegar a uma grande pedra que dava a visão do mar e da lagoa vermelha. De certa forma foi o melhor momento da viagem, acho que para todos nós, sentir a natureza, o vento, ver a areia da praia flutuar no horizonte. Muitos desceram e correram pela praia, eu fui um deles, corremos como se a vida fosse eterna, corremos por todos, corremos por nós mesmos, pisoteando a areia fofa, girando e correndo com o avançar das ondas sobre nossos pés, dava para sentir “vida pulsando” como disse nosso professor Manoel Flávio.
Depois de vermos a lagoa do mirante, voltamos e tivemos que nos despedir da praia. Ficaram na areia somente nossas finitas, mas, a recordação daquele momento, seria como pegadas na mente difíceis de apagar.
Voltamos pela trilha, divididos em grupos um pouco distantes um do outro, a maioria exausta por conta dos milhares de metros percorridos.
Por fim chegamos ao ponto de partida, e nos preparamos para voltar. Estávamos atrasados por sinal, mas ninguém estava se importando para o relógio, a não ser o motorista. Bom, todos temos nossas razões, ele estava com pressa, e nós estávamos apenas com sede. Assim, entramos no ônibus, e a noite já ameaçava engolir o sol e a restinga. A volta foi um pouco melancólica, a maioria dormindo, outros ainda com energia para se gastar, e logo a penumbra engoliu o ônibus e a estrada. As cenas do passeio flutuavam sobre nossas cabeças, como flashbacks, sobre o silêncio eu via todo mundo dormir, como se corressem de novo pela praia, sem preocupação, nem metas, nem tarefas, e nem dia seguinte, apenas dormiam. Aquela sensação me fazia pensar que aquilo foi uma daquelas experiências únicas, o grupo, as histórias e brincadeiras, é algo que só se vive uma vez, mas cada um voltava para casa com histórias para contar.
Foi realmente uma bela experiência. É disso que as escolas precisam: botar os alunos na prática, botar eles na vida, tirar essa teoria do papel, amassar e jogá-la na estrada, para ser rasgada, pensada, refutada, e acima de tudo, para ser vivida e sentida por cada um, isso nos faz mais humanos, desentedia esse atual clima mórbido das escolas.
Valeu muito a pena esse aprendizado fora da sala de aula.






